quarta-feira, 11 de julho de 2012


O vulcão açoriano

Vem este título a propósito dum texto publicado ontem pelo Ciberdúvidas, e cuja autora é uma professora de português duma Escola nos Açores, em Vila Franca do Campo. O nome da senhora é DORA PATRÍCIA CAMBÓIA.
O  seu zelo vulcânico pela língua portuguesa é tal que me deixa muito maltratado, chegando a pedir ao Ciberdúvidas que apague respostas minhas, pois elas “em nada dignificam o vosso trabalho”.

Esta senhora professora  tem, no Ciberdúvidas, um modelo: ela é fiel seguidora das análises feitas pela Dra. Maria Regina Rocha (“a única credível”, nas suas palavras).
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A senhora professora açoriana  retoma uma frase que eu analisei e onde, segundo ela,  é evidente o meu erro, felizmente corrigido pela Dra. M.Regina Rocha. E a frase é:
                  Joana declarou-se capaz de falar em público

Como a Dra. M.Regina Rocha, também ela afirma que aquele “se” é inequivocamente complemento direto e não sujeito como esse senhor (sou eu!) categoricamente afirma num discurso afetado.

Estão aqui em causa, além dos erros das duas professoras, o comportamento do Ciberdúvidas. Quando alguém, sem qualquer fundamento, lhe disse que uma resposta minha estava errada, o Ciber apressou-se a apagá-la. Quando é evidente que as respostas da Dra. Regina, no texto em que pretende corrigir-me, são uma sucessão de erros, o Ciberdúvidas não as apaga, e o resultado é evidente: numa Escola dos Açores, uma professora ensina disparates porque o Ciberdúvidas os mantém em linha.

Aquele texto que a Dra M.Regina Rocha publicou, pretensamente para corrigir erros meus,  deve ser apagado. Ele está inequivocamente errado, e induz em erro, como se prova com a declaração da nossa Colega dos Açores.
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Nem a Dra. M. Regina, nem a nossa Colega Açoriana deveriam ignorar que o complemento direto da voz ativa é o sujeito da voz passiva. Ponham aquela frase na voz passiva, e vejam se aquele se (ela) é sujeito do verbo declarar.  Verificarão que aquele se, na voz ativa,  não é complemento direto do verbo declarar, pois não pode ser seu sujeito  na voz passiva.

Para evitar dúvidas, ponho eu a frase na voz passiva:
Por Joana foi declarado que (ela própria) é capaz de falar em público.
Frase composta.
Suj.: a oração subordinada substantiva, completiva: que ela é capaz de falar em público; Pred.: foi declarado por Joana; por Joana: complemento agente da passiva, ou, de preferência, complemento de por.

Na voz ativa, a análise é:
         Oração composta.
         Suj.: Joana; pred.: declarou-se capaz de falar em público; se, capaz de falar em público: complemento direto.

         - se, capaz de falar em público: oração reduzida, oração pequena ou cláusula mínima, subordinada substantiva, completiva.
         Suj.: se; pred.: capaz de falar em público.

Estas análises não são opiniões. São as únicas gramaticalmente corretas.

O Ciberdúvidas, se quiser ser justo,  deve apagar os textos das duas professoras. Comprovadamente, eles divulgam disparates.

2 comentários:

Dora Patrícia Cambóia disse...

Caro Senhor,

Soube que enviou para a Escola onde leciono emails a solicitar o meu contacto. Por isso, descoberto este blogue, aqui venho ao encontro de V. Ex.ª num registo menos vulcânico (o adjetivo é do Senhor).
Lidas algumas das entradas deste ciberespaço que administra, penso compreender agora melhor algumas das análises que efetuou no portal Ciberdúvidas da Língua Portuguesa http://www.ciberduvidas.com/pergunta.php?id=30951; http://www.ciberduvidas.com/controversias.php?rid=2528) e que contestei implacavelmente, reconhecendo por isso que terei sido demasiado contundente nas palavras que o Ciberdúvidas decidiu publicar ― apesar de continuar a não concordar com alguns aspetos das análises que faz, tendo designadamente em conta a nomenclatura gramatical até ao momento vigente em Portugal.
Efetivamente, há de compreender que, não havendo no Ciberdúvidas uma contextualização para o que defende, ou seja, que a gramática «atual» a que se refere é a que se publicou em Espanha em 2009 (Nueva Gramática de la lengua española) ― informação que veicula neste CiberSintaxe ―, não se pode concordar com algumas das análises que aí faz, daí provavelmente a polémica que suscitou naquele ciberespaço. Além disso, no meu entender, na entrada A Construção Impessoal Reflexa (http://www.ciberduvidas.com/pergunta.php?id=30951), o Senhor não deixa suficientemente claro que considera o “se” sujeito, MAS da segunda oração*! Já neste CiberSintaxe, isso fica mais claro: relativamente à primeira, é parte do complemento direto**. Ou não terei entendido novamente bem?!
Assim, em relação às entradas do Ciberdúvidas, só uma releitura mais plácida deixa compreender que considera o “se” sujeito da segunda oração, mas parte do complemento direto da primeira, apesar de nunca referir que se segue o predicativo do complemento direto (numa primeira e segunda leituras, o tom afetado e por vezes irónico com que se dirigiu aos consulentes fecha as entendedeiras a pessoas impulsivas como eu). Se a frase realmente se dividir como a divide, concordo plenamente que o “se” seja sujeito da segunda oração, mas confesso que tenho dúvidas quanto a essa divisão por causa dos verbos predicativos transitivos diretos, que exigem um complemento direto e um predicativo do complemento direto. E quando tenho dúvidas que não consigo esclarecer devidamente, uso o bom senso: evito esses exemplos em contexto de sala de aula. Se eventualmente erro sem intenção e descubro depois que lecionei algo que não estava correto, reconheço junto dos alunos a falha e corrijo o que houver a corrigir, ainda que não seja agradável passar por esta situação.

(continua no segundo comentário, por falta de espaço neste)

Dora Patrícia Cambóia disse...

(continuação)

Neste CiberSintaxe, «cujo objetivo fundamental […] não é criticar» (perdoe-me, mas parece o contrário), fala em «continuar a análise de algumas frases erradas, a fim de podermos tirar algum proveito de erros alheios». E de quem são as frases e análises que critica e que chega a deturpar, por omitir neste espaço alguns aspetos***?! Da Dr.ª Maria Regina (de quem até pode pensar que sou advogada, mas, acredite, não sou), a quem se refere num tom ainda mais afetado e sarcástico. Esta Senhora pode ter discordado de V. Ex.ª, mas, no que li, foi politicamente correta, sem ironias e sem nunca o ter nomeado diretamente. Já o Senhor, desculpe a impertinência, que mostra estar numa fase mais avançada no que respeita ao estudo da sintaxe e, portanto, pretende romper de viseira com a gramática institucional que de momento vigora em Portugal, usa um discurso sarcástico que talvez não agrade e constitua uma barreira para que as devidas entendedeiras lhe abram as portas mais depressa: «Ninguém ligou ao que eu tenho dito, explicado e demonstrado. Ninguém. Mas, a partir de 2010 já toda a gente deveria ter ligado.»
Cumulativamente, à luz da gramática atualmente em vigor em Portugal, também não posso concordar com algumas coisas que advoga, como referi. Sabe com certeza que há um programa institucional a cumprir e que não posso, eu, uma simples professora que, como o Senhor afirmou, «numa Escola dos Açores […] ensina disparates, porque o Ciberdúvidas os mantém em linha» (Ciberdúvidas esse que o novo Programa de Português do Ensino Básico recomenda, na página 167), negligenciar, nomeadamente porque os discentes estão sujeitos a exames nacionais e/ou regionais onde devem responder de acordo com a gramática institucionalizada no nosso país e, portanto, não posso lecioná-la “à espanhola”, ainda que, confesso, concorde, eu e tantos outros professores de português (atrevo-me a dizer que seja a maioria), com o Mestre Virgílio na crítica que faz a designações como “sujeito nulo expletivo”, “complementos oblíquos”; ao desaparecimento dos complementos circunstanciais, etc. Agora: imagina as consequências profissionais que poderiam advir se ensinasse, por exemplo, o que é um predicativo do sujeito (designação a que o Senhor antepõe o nome “complemento”, combinação que, confesso, nunca tinha encontrado antes) de acordo com a teoria que o Senhor veicula?! Isto para não falar nas consequências na avaliação dos próprios alunos. Mas estamos de acordo neste ponto: as alterações trazidas pelo Dicionário Terminológico não servem o ensino da gramática, mas, enquanto estiver em vigor, resta-me ensinar em conformidade com ele.

* «7. Mas o se pode ser sujeito em orações reduzidas – e, nesse caso, terá de admitir predicativos. Será verdade? Tentemos:
«João declarou-se capaz de falar em público.»
Representemos graficamente:
– O João declarou [-se capaz de falar em público]: o João declarou [que ele mesmo era capaz de falar em público].
Notemos a oração entre parêntesis reto, em que o -se é, claramente, sujeito. Se o for, já o dissemos, pode receber uma predicação adicional, assim:
– João declarou- [se, mesmo gago, capaz de falar em público].
Ou:
– João fingiu- [se, mesmo doente, grande cantor do fado de Coimbra].
Sim! Este se é sujeito.»

** «o se não é complemento direto, mas, apenas, parte dele» ( o negrito e sublinhado são meus).


*** «E torna-se, assim, evidente que está errada a análise seguinte da Dra. Maria Regina Rocha:
O Conservador declarou-os marido e mulher
Suj.: o Conservador; pred.: *declarou-os (não! Isso não quereria dizer nada!). O Conservador declarou-os marido e mulher, declarou eles marido e mulher, declarou que eles são marido e mulher.» (Deturpa o que diz a Dr.ª Maria Regina Rocha, na medida em que ela fala do predicativo do complemento direto, pedido pelos verbos transitivos predicativos, aspeto que o Senhor oculta aqui neste espaço).