segunda-feira, 7 de novembro de 2016

Recitais de Poesia: para quê?

Pelo que temos dito da poesia de António Salvado, fácil será deduzir que se trata de poesia erudita, meticulosamente trabalhada. É, pois, natural que a sua leitura exija elevada competência literária, já que o leitor deverá reconhecer vocábulos, frequentemente eruditos, estar familiarizado com recursos técnicos próprios da arte e, acima de tudo, ser capaz de desvelar a estória que naqueles versos se oculta. Quem não tiver competência literária, só por si, não este tipo de poesia, mas treslê.

Não deverá, então, haver leitura pública de poesia erudita?
Deve, e seria muito útil, se cada poema, antes de lido, fosse cuidadosa, lenta e pacientemente explicado aos ouvintes por comentador competente.

Sem ser comentada, recitada à maneira de espetáculo, esta poesia esvair-se-á entre sorrisos de simpatia, sem qualquer utilidade. E é pena!


sábado, 22 de outubro de 2016

De novo, António Salvado

1.Antes da Poesia, o doutoramento.
A Universidade da Beira Interior – a minha última Universidade – reconheceu em António Salvado tão elevado mérito que lhe atribuiu o grau de Doctor Honoris Causa (Doutor em razão do seu elevado mérito).
Concordamos inteiramente, e louvamos a atitude da UBI. Olhar para a sociedade e distinguir os melhores é um modo de intervenção tão importante como a própria função de ensinar.
Parabéns à Universidade e, evidentemente, ao António Salvado que tudo tem feito para merecer tal distinção.

2.Agora, os livros
António Salvado volta aos livros, e acaba de publicar UM ADEUS SOLIDÁRIO DE TERNURA seguido de COM AS MESMAS PALAVRAS.
É sempre com gosto que voltamos à sua leitura, que partilhamos com quem, no mundo, vai tendo paciência de nos ler. [Os nossos leitores da última semana foram de Portugal, França, Brasil, Alemanha, China e Lituânia].

Já várias vezes dissemos que os nossos comentários poéticos não são obra de crítico literário, mas, apenas, revelação do nosso modo de ler poesia. Não pretendemos valorizar mas, apenas, sugerir caminhos de leitura. Só assim devem ser lidos os nossos comentários poéticos.

Um poema é uma obra de arte como uma obra musical, uma escultura, um bailado ou uma pintura, diferindo, apenas, no modo de cada uma ser visível. O modo próprio da poesia é a sua estória  - uma estória que encante o leitor pela surpresa do enredo, pelo inesperado da argumentação, pela cuidada seleção das palavras e, não menos importante, pelo rigor da sua forma.  
Diferem, decerto, de tal entendimento muitos poetas e muitos críticos atuais. Mas nós não conseguimos envolver-nos em abstrações que não entendamos – e até nos custa considerar poeta de boa-fé quem nos proponha poemas que não tenha sido capaz de fazer inteligíveis. Quem lê o ininteligível não lê: possivelmente gostará de criar estórias a partir do que lê. Esses serão leitores fingidores mas fingir, já Fernando Pessoa o disse, é função de poetas, e nós detestaríamos usurpar a estes o privilégio de fingir.

Pode, pois, e deve o António Salvado continuar, como poeta, a fingir, tecendo belas estórias em cenários verossímeis, com uma riqueza vocabular rara e com uma invulgar perfeição formal, clássica. Arte é trabalho a que o Homem se aplica para criação de coisas belas. Enquanto a natureza, espontaneamente, cria coisas tão belas quanto uma flor, o artista só com trabalho (arte) consegue aproximar-se da Beleza.

António Salvado, artista de muito saber, trabalha os seus poemas com a mesma seriedade e cuidado do estatuário de Vieira: aqui corta, ali acrescenta, além altera… Só assim são possíveis os seus poemas que até formalmente são perfeitos.

3. Finalmente: para não nos alongarmos, deixamos para breves dias o comentário de um Poema que selecionaremos no livro acima referido.
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Nota:

Por estória entendemos qualquer efabulação de episódios verossímeis.

sábado, 7 de maio de 2016

As linhas que perduram
António Salvado, Edição RVJ Editores Lda

O António Salvado acaba de publicar um outro livro…de versos, como é natural. Há muitos anos que ele respira poesia, e, felizmente, o verso não dá quaisquer sinais de murchar nos seus lábios; antes me parece ganhar qualidade. Tenho a impressão de que estas suas linhas que perduram têm qualidade para perdurarem longamente.
Claro está que este meu juízo não tem qualquer validade crítica; nem eu, em tal matéria, tenho saber capaz de emitir juízos de valor. Mas sinto que por todos aqueles versos perpassa uma beleza que não sei explicar, mas que me prende.

Este livro de poesia não é mera coletânea de momentos poéticos diversos, como há muitos e, em muitos casos, de grande agrado e merecido sucesso.
LINHAS QUE PERDURAM é livro de tese – e resulta de uma sucessão de respostas multifacetadas a três momentos de vida: três temas, claramente definidos: 
1: Da vida / da morte; 2: Névoa com brancuras; 3: A gazela fugidia (elementos para um outro Cantar dos Cantares).  
Por palavras, decerto menos poéticas (as minhas), este livro é resposta a três teses: 1: a vida e a morte não são um mundo fechado em noite escura; 2: porque é sempre possível a esperança – 3: Deveremos, pois, aspirar a um mundo de luz em percurso místico, porque é em tudo e em todos que Deus mora (verso 13 de Amado de Albicastro).

Não faremos uma análise global da obra, que isso é tarefa para críticos literários. Mas, como professor de português, tomarei um dos seus poemas, e farei aqui a sua análise como se estivesse ainda a dar aulas. Para um professor os alunos são eternos.